Em tom às vezes duro, às vezes com desdém, parlamentares consideraram fora de propósito a tentativa de juízes aumentarem os próprios salários à revelia do Congresso, através de ação no Supremo Tribunal Federal (STF). A polêmica é o mais novo capítulo das rusgas entre Legislativo e Judiciário, evidenciadas após a decisão do STF em relação à Lei da Ficha Limpa, na semana passada.
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), reagiu ontem contra a iniciativa dos juízes, que alegam que, diante da omissão do Legislativo em não aprovar o reajuste dos vencimentos da magistratura, o Supremo poderia tomar essa iniciativa.
Maia aproveitou para criticar outra proposta do Judiciário - feita pelo presidente do STF, Cezar Peluso - de instituir um controle de constitucionalidade para projetos aprovados pelo Congresso encaminhados para sanção presidencial. 'Temos na Câmara uma Comissão de Constituição e Justiça que tem responsabilidade de discutir constitucionalidade dos projetos e fazemos (isso) com zelo e transparência. Não me parece necessário consulta prévia', disse Maia.
Críticas. Líderes de bancada seguiram a posição do petista. Na semana passada, parlamentares já haviam criticado a proposta de Peluso. Ontem, atacaram a iniciativa da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), que espera que o Supremo determine o reajuste da magistratura.
'É descabido e não tem nenhuma consequência que possa ser levada a sério', reagiu o líder do DEM, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA). O deputado afirmou que o reajuste é prerrogativa do Congresso prevista na Constituição. 'O Supremo tem de ser o guardião da Constituição e não pode ser o pai da inconstitucionalidade.'
O mesmo raciocínio foi usado pelo presidente da CCJ do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). 'Não cabe fazer nenhum tipo de comentário. A Constituição é clara em relação às prerrogativas de cada Poder', afirmou.
O líder do PSDB na Câmara, Duarte Nogueira (SP), também foi sucinto: 'O foro constitucional para dar cumprimento a essa questão é o Congresso. Não tenho dúvida de que os juízes, zeladores da Constituição, vão concordar com a minha opinião.'
Enviado em agosto à Câmara, o projeto do Supremo de aumento salarial não tem data para entrar em votação. O projeto eleva de R$ 26.723 para R$ 30.675 os subsídios dos ministros do STF e tem efeito cascata. Segundo a própria Corte, o impacto no âmbito do Supremo seria de R$ 2,022 milhões e de R$ 446,764 milhões no Poder Judiciário da União.
Atalho. Sem ver o projeto aprovado no tempo desejado, a Ajufe tentou criar um atalho. A entidade e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) enviaram à secretaria da Mesa uma nota técnica defendendo que a proposta dispensava votação no plenário - bastaria o aval das comissões permanentes. Não deu certo: a Câmara manteve a necessidade de votação em plenário.
Rota de colisão
MARCO MAIA (PT-RS)
PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
'Temos uma Comissão de Constituição e Justiça que tem responsabilidade de discutir constitucionalidade dos projetos e fazemos (isso) com zelo e transparência. Não me parece necessário uma consulta prévia'
ACM NETO (DEM-BA)
LÍDER DO DEM NA CÂMARA
'É descabido e não tem nenhuma consequência que possa ser levada a sério. Não existe isso. O Supremo
tem de ser o guardião da Constituição e não pode ser o pai da inconstitucionalidade'
Orçamento
R$ 26.723
reais é o salário mensal dos ministros do Supremo
R$ 30.675
reais é o valor proposto pelo Judiciário para o novo subsídio
R$ 2,02 mi
é a previsão de aumento no âmbito do Supremo
R$ 446,76 mi
é o impacto previsto no Poder Judiciário da União
Denise Madueño / BRASÍLIA, estadao.com.br